sábado, 12 de novembro de 2011

O rapaz dos campos de ténis #5 - I'm beating you!

Hello my dear readers.
Este post hoje não é sobre o moço, mas é para o dito. Hoje não há música no blog (que alívio, hein?) porque vão ter muito que ouvir - ou não.
Pois meu querido amigo, hoje digo-te que podes ler muito, podes saber muito de livros, mas de certeza que não tens um gosto musical fantástico. E tenho a certeza porque quero ter a certeza, de maneira que não há cá reclamações. Vamos entrar numa aventura musical e portanto, toca de prestar atenção e ouvir, a ver se cultivas um bocadinho o teu ouvido.


1) Danúbio Azul. É extremamente conhecida e nada original, mas eu tenho uma historiazinha com ela. Uma vez estava no carro do meu pai e esta música começou a tocar na rádio. Naquela altura ele ouvia muito música clássica - e até hoje é um dos seus géneros musicais preferidos - e eu enquanto criança, irritava-me sempre por não ter voz. A uma determinada altura, nesse dia, revoltei-me e disse: muda a música, eu não gosto dessa. E ele respondeu-me: filha, a música clássica educa o ouvido. E a partir daí, comecei a prestar atenção porque uma vez uma professora minha disse-me que nós não nos apercebíamos que crescíamos porque nos víamos todos os dias. Então eu pensei: se me estão a avisar que vou crescer, agora que não tenho os ouvidos educados, vou decorar este momento para comparar comigo mesma mais tarde, quando já os tiver. Como já era de esperar, não reparei na educação que os meus ouvidos foram tendo, mas aos 10 anos entrei para o violino. Just sayin'.


2) Verdi, a parte dos escravos (I'm so sorry, mas eu sempre chamei assim...)
A casa da minha tia é a antiga casa onde os meus avós viveram. Desde miúda que a associo sempre a duas coisas. Não se pode saltar nem correr lá dentro e sempre que entramos está a tocar ópera e cheira bem. Também nos meus anos de criança, na altura em que ainda brincava com Barbies, levei umas quantas para a casa dela. O meu primo decidiu pôr esta ópera e brincar comigo, fingindo que eram as Barbies que cantavam. Vai daí, também nunca mais me esqueci e agora tenho grande parte das obras de Verdi na minha playlist. Tudo por causa do hábito de ir à casa da minha tia e de ficar sentada nos sofás azuis a ver televisão sem som enquanto ouvia ópera, sem sequer pensar sobre isso.


3) Beatles, Love me do
Quando viajei até aos Estados Unidos com a minha mãe e o meu padrasto, esta música começou a tocar num restaurante onde estávamos a jantar. Eu disse, toda contente, que gostava muito da música. O meu padrasto, que gosta muito de Beatles também, disse-me assim: eu também gosto, só tenho pena que eles tenham passado por uma fase em que tiveram que se disfarçar para cantar e para serem bem recebidos pelas gentes. Eu fiquei com aquilo na cabeça e a partir daí, passei a relacionar algumas das suas músicas ao carnaval: é o tempo em que nos disfarçamos e quem não se disfarça, é um bocado posto de parte. Pensando bem, devia era relacioná-la com o quotidiano. Pela mesma razão.


4) Sérgio Godinho, Fotos do Fogo
Posso relacionar Sérgio Godinho com qualquer fase da minha vida sem o mais pequeno problema. No entanto, esta música tem um lugar e um tempo bastante específico no meu crescimento. Tinha acabado de me tornar militante de um partido político quando a minha mãe me ofereceu um álbum em que ele a canta numa versão nova (aviso desde já que não comentarei o seu trabalho actual). E nunca me tinha dado conta da letra. Quando me apercebi, deu-se um nó na minha garganta e agora, sempre que a oiço... Principalmente a parte final, em que o soldado que veio da guerra decide guardar todas as fotografias e diz 'álbum das fotos fechado, volto a ser quem não era'. Essa frase mata-me por dentro.


5) Maria Bethânia - Sonho impossível
A Bossa Nova é uma parte muito importante do meu crescimento musical, assim como a música francesa dos anos 50/60. Estive bastante indecisa para escolher uma em especial, mas decidi-me por esta da Bethânia.
Numa ocasião, estava na minha casa, na ilha Terceira, e esta música começou a tocar na nossa aparelhagem, uma preta com um ecran verde que julgo já não existir, de um cd que provavelmente o meu padrasto tinha posto. Eu era miúda, tinha aí uns cinco anos, e lembro-me bem de a minha mãe dizer que esta senhora era muito feia mas tinha uma voz e uma força incríveis. Passei anos a ouvi-la e muito mais tarde descobri a sua cara. Para minha surpresa, não a achei nada feia. Achei-a tão bela como as suas canções. Realmente julgamos o físico consoante a ideia que vamos construindo da pessoa e é por isso que não consigo nunca dizer se alguém é bonito ou feio depois de ter conversado um bocadinho com a pessoa. Uma vez, a Filipa perguntou-me se eu achava a minha mãe bonita e até hoje, a minha resposta só podia ser que sim, embora eu tenha noção que é bastante parcial.


6) Ivete Sangalo - País Tropical
Para que fique já esclarecido, eu não gosto de Ivete Sangalo nem deste tipo de música carnavalesca brasileira. O que se passa é que era costume eu ir passar carnavais a uma festa que se fazia no Coliseu Micaelense. Ia sempre com amigos, mas nunca com um par. E por essa razão, eu gostava quando passavam estas músicas porque não me sentia envergonhada por dançar sozinha. Creio que é como disse na música acima: não consigo ser imparcial com uma música se não tiver memórias onde ela esteja incluída.

7) Leonard Cohen - So long, Marianne
E eu podia passar o resto dos meus posts a falar do meu amor incondicional por este homem, pela sua voz, pelas suas letras e pelas suas músicas. Para mim, tem o pack completo e acho que só há mais um cantor (que é o Jacques Brel) que também é assim. Este é como o Sérgio Godinho. Podia acompanhar o meu crescimento só com músicas dele. No entanto, esta aqui tem uma conotação mais recente, porque é a música com a qual começo sempre a estudar. Não sei porquê, concentra-me imediatamente. Só peço uma coisa: se algum dia me quiserem mandar uma música, NUNCA MAS NUNCA me mandem Leonard Cohen. Porque se por acaso nós tivermos uma discussãozinha ou uma briga, eu não quero associar a voz do Deus à pessoa que ma enviou. Quando o oiço, quero que seja por minha iniciativa e sozinha. Eu prometo que também nunca o vou enviar. Só por curiosidade, acabei de ver o número de reproduções desta música no meu iTunes e ele contabiliza 1054. 1055 agora mesmo.


8) Cat Stevens - Morning has broken
Cat Stevens no geral acompanhou a minha adolescência. Qualquer adolescente se sente diferente dos outros adolescentes e muitas vezes, na altura em que ainda se usava o messenger e as mensagens não eram de borla, eu falava com os meus amigos a ouvir o cd em que isto estava, por uma razão bastante simples.
Como o cantor se tinha convertido ao Islamismo, tinha realizado uma grande mudança no seu interior. Eu sentia que também estava a mudar mas que ainda não tinha dado o verdadeiro salto. Portanto, ouvia Cat Stevens. Prometi-me a mim mesma que quando sentisse o salto a dar, ia 'ouvir' Yusuf Islam, que foi o nome que adquiriu depois de se converter. Tantos anos passados e Cat Stevens é o que oiço. Para mal dos meus pecados, começo a achar que quando for altura de ouvir Yusuf Islam, vou ser uma pessoa extremamente aborrecida e conformada, porque vou ter a ideia de que já fiz a mudança e que portanto não vou precisar de investir mais em mim.


8) Françoise Hardy - Tous les garçons et les filles
Como já tinha referido ali em cima, a música francesa deixa-me com uma enorme nostalgia. Desde há muito tempo que acho que a música serve essencialmente para uma coisa: para cultivarmos em nós a sede de conhecimento e a nossa capacidade de interpretação e para, ao mesmo tempo, curarmos males. Não acredito que não haja uma música que interpretemos do mesmo modo se a ouvirmos em duas fases diferentes da nossa vida. E a música francesa faz isso na perfeição, porque julgo que o embalo da língua nos deixa bastante absortos na letra. Penso sempre que cantar em francês é cantar duas canções numa só, porque as palavras são ditas num ritmo diferente dos instrumentos e eu julgo sempre situar-me no meio da música cantada e da música tocada. A música francesa é uma música de extremos e a nossa posição enquanto ouvintes é no meio dela, uns dias mais à direita, quase tocando nos intrumentos, outros dias mais à esquerda, quase tocando na voz. Françoise Hardy demarca bem isto que eu estou a dizer e esta música em especial já foi interpretada por mim umas quantas vezes.


9) Tracy Champan - Behind the wall
Esta música serviu de teste numa aula de inglês. A professora pô-la a tocar e nós ouvimos e completámos a letra. Para que vos possa enquadrar no seu significado, tenho que explicar que eu sempre tive uma pequena obsessão com o tema da violência doméstica. Gostava de escrever sobre isso, gostava de ouvir histórias e gostava de ouvir músicas sobre o tema. Esse gostar não é sádico, obviamente, mas sim melancólico também, porque me fazia sentir que tinha tanta sorte por não sofrer dela, que quanto mais histórias ouvia, mais vontade tinha de ajudar as outras pessoas. Um dos meus objectivos era trabalhar na APAV com vítimas de violência, depois de, numa ocasião, no quinto ano, um colega meu me mostrar marcas de murros no seu pescoço, dados pelo seu pai. Fiquei muito tempo com pesadelos por causa da situação e por causa da minha impotência, já que o caso foi denunciado e a mulher e os filhos ficaram com o senhor em vez de a senhora pedir o divórcio. Aliás, uns anos mais tarde tiveram outra filha.


10) Jacques Brel - Ne me quitte pas
Não podia deixar de pôr esta música aqui, embora quem me conheça saiba que eu não passo mais de um mês sem a ouvir pelo menos uma vez. É um problema que eu tenho com as músicas, nunca me farto delas, estou sempre a ouvir as mesmas e em loop. Até saber cada nota mentalmente. O ponto de toque é quando a consigo assobiar na integridade e 'cantar' a letra na minha cabeça. Aí sim, sei que tenho a música em mim. Esta foi a primeira música completa que eu soube assobiar. Por acaso no outro dia estava a ler interpretações da música e havia alguém que dizia que não era uma música sobre amor, mas sim sobre a fraqueza dos homens. O que me fez lembrar a do Leonard Cohen, I'm your man.


11) The Bird and the Bee - Preparedness
Esta em especial faz-me muito lembrar a Sofia. Primeiro, porque foi ela que me apresentou a banda e segundo, porque esta música tem forma de corpo de mulher e a Sofia é a rapariga que eu conheço que tem mais 'corpo de mulher'. É verdade que soou a estranho, mas também é verdade que lá por ser estranho, não quer dizer que seja verdade. As memórias associadas a Bird and the Bee são totalmente citadinas e lisboetas. Lembra-me centros comerciais e lamento não haver uma história mais profunda por trás dela.


E aqui está. Ia continuar a seleccionar músicas que me lembram coisas, mas caramba, já chega, já está demais. É bom relembrar que a música tem uma grande influência na minha vida. No entanto é pena que eu só goste de um determinado género. Tem que ser melancólico, triste, lento. Quanto mais voz tiver, melhor. Se for acapella, deliro.
É verdade que sou uma pessoa bastante 'emotional' (só me ocorre esta palavra, nem sequer sei como traduzir. É triste. Emocionável? não sei...) e bastante alegre. Portanto acho que este género de música acalmam a alegria constante. Como li há pouco tempo, é necessário haver interrupções no contínuo para ele poder ser eterno. É assim que se passa comigo. A melancolia das músicas impulsiona a minha felicidade vindoura.
Não é por acaso que as minhas pintoras favoritas são Frida Khalo e Paula Rego.


Frida


A mulher cão - Paula Rego
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