terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Rugas

Sempre quis saber desenhar e cantar. Não sei bem o que escolheria se tivesse que escolher uma arte das duas. Dizem-me que toda a gente é capaz de desenhar e toda a gente é capaz de cantar, mas eu não acredito. É verdade que não sou uma completa naba no que toca a desenho, lá de vez em quando faço uns tracinhos engraçados, mesmo que seja após horas à frente daquela figura.
Não tenho jeito para nada em especial e quando era mais miúda, isso dava cabo de mim. Todas as minhas amigas sabiam fazer alguma coisa muito bem feita, algumas com mais esforço, outras com menos, mas sabiam. Eu, por mais que me esforçasse, nunca nada artístico me saía bem.
Até que descobri que gostava de apreciar o trabalho dos outros, nomeadamente fotografia. Também não as sei tirar, longe de mim, que a única coisa que sei é não cortar cabeças e isso já é uma grande sorte. Mas se considerarmos que nem toda a gente é capaz de criticar o trabalho que não é seu e pegar em partes as quais ninguém repara, então é capaz de ser um avanço, não é? Pelo menos eu quero acreditar que sim.
No que toca à fotografia, o que eu gosto mesmo é de rostos e nus. Por alguma razão, as paisagens e a natureza morta não me fascinam. De facto, até faço uma pequenina ideia. Julgo que é porque a minha mãe sempre tirou muitas fotografias desse género, ah, o que ela gosta de fotografar flores... E isso irrita-me, porque não lhes consigo encontrar expressão, não consigo estabelecer identificação entre elas e as pessoas. Fotografias de flores parecem-me um universo paralelo, como fotografias de galáxias, que são bonitas, indiscutivelmente, mas captar aquele momento ou captar o momento a seguir não faz muita diferença para quem vê porque não se dá conta da continuidade e da evolução do universo. Assim acontece com paisagens e flores.

Mas os rostos, os rostos deixa-me completamente fascinada. Principalmente os de pessoas idosas. Os de criança, nem por isso, porque lá está, há toda a questão da mudança e do tempo e essa é demasiado rápida para podermos congelar numa imagem. Sou forçada a dizer que de uma criança só deviam existir filmes, nunca fotografias. A partir do final da adolescência até à morte, então sim, uma fotografiazinha de vez em quando a acompanhar a imagem móvel.
Mas os rostos velhos, deformados pelo tempo, a pele gasta transformada em rugas... Isso sim. Vale a pena ver e apreciar.

Olhares.com
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