domingo, 11 de setembro de 2011

Feminismo e Ecofeminismos


Hoje, quando entrei para o banho, olhei para as minhas pernas e pensei que me devia depilar.

Devo dizer que desde os 12/13 anos que tinha uma opinião bastante vincada acerca da depilação, das cirurgias plásticas, do uso de soutien e do nudismo, qual Mary Daly. Achava que as pessoas deviam ser como eram, que não deviam ser feitas modificações e que nada era pretexto para tirar um pêlo, modificar o nariz ou suportar as mamas num pedaço de pano. As praias nudistas atraiam-me e nunca tive qualquer espécie de pudor em relação a isso. 

Sempre cresci num lar onde o feminismo, às vezes extremo, imperou. As minhas casas sempre foram feministas, lia livros essencialmente escritos por mulheres e comecei a ler Beauvoir bastante nova, com a ajuda da minha mãe, que formava uma adolescente que tendia a "feminizar" tudo o que encontrava e quando não era possível, fazia beicinho e birra. E isso cresceu comigo e desenvolveu-se, julgo que demais. Eu própria alimentava esse feminismo e comecei a criar uma espécie de aversão aos homens. Em vez de defender as mulheres como iguais aos homens, comecei a defendê-las como superiores, como mais inteligentes, como manipuladores da sociedade masculina de hoje. Mas continuei a crescer e comecei a ter mais amigos rapazes. As minhas amigas começaram a ter namorados e eu torcia (e torço um pouco, ainda) o olho cada vez que algum mo era apresentado.  Quando entrei para a faculdade, a minha professora de Ética mandou-nos fazer um exame sobre um "tema livre", mas que estivesse compreendido no programa. Eu escrevi sobre o feminismo. Não o vou reproduzir aqui pelo facto de achar que está demasiado histórico. Está um texto mais informativo do que uma opinião pessoal. 

A verdade é que de há um ano para cá, comecei a achar que esta posição extrema não estava correcta. Como é que uma pessoa pode defender igualdade entre géneros, igualdade entre animais e pessoas se depois não compro com o que prego? Eu entendo que quando dizemos igualdade de géneros, queremos dizer que os homens sempre detiveram o poder e as mulheres sempre foram inferiorizadas. Mas isso não é motivo para invertermos o conceito e dizer que feminismo é o contrário de machismo. Porque quando dizemos que alguém é machista, queremos dizer que alguém considera os homens acima das mulheres, sob qualquer ponto de vista. Ora, quando falamos do feminismo, queremos defender a igualdade e não a superioridade do sexo feminino. E então, comecei a investigar outras correntes feministas.

Assim, comecei a perceber de que forma é que coisas aparentemente tão distintas, como o cuidado dos animais, o comê-los, e a Mulher estavam tão interligadas como Mãe e Filha. Se imaginarmos que o ecofeminismo é a junção de ecologia com feminismo, facilmente chegamos à conclusão de que as mulheres sempre tiveram um papel determinante na relação com a terra e agora querem reivindicar um papel específico para elas na sociedade em que se inserem hoje e em que a natureza receba o respeito que lhe é devido. A opressão feminina/natural (de natureza) tem uma raiz comum, na medida em que as mulheres e a natureza são utilizadas para proveito próprio, ignorando os seus direitos e interesses. Mais concretamente, podemos dizer que o domínio a que as mulheres têm sido sujeitas é entendido como parte da política destruidora que os homens têm aplicado à natureza. Aliás, é bastante comum afirmar que as mulheres têm um papel especifico na sociedade: o cuidado. E as ecofeministas querem construí-la tendo-o por base.

Cuidar é mais do que um acto, é uma atitude. Portanto abrange mais do que um momento de atenção, de zelo, de desvelo. representa uma atitude de ocupação, de preocupação, de responsabilidade e de envolvimento afectivo com o outro. (1)

Esta é a noção base de Ecofeminismo, que depois se alarga por diversas correntes (daí, "ecofeminismos"). O meu ponto é o seguinte: não é por utilizarmos soutien, por não nos depilarmos ou por fazermos cirurgias plásticas e usar maquilhagem, que a nossa igualdade com os homens se torna "mais igual". E também não é por usarmos tudo isto que nos tornamos superiores. A igualdade está sim no respeito que deve ser fomentado, quer em homens, quer em mulheres, pela "Mãe" que cuida e que não existe para servir. A igualdade está, mais que nesse respeito, na necessidade de uma natureza feminina interior, para contrabalançar com extremismos machistas e feministas como contrário destes.

Por isso, hoje no banho, depilei-me.

(1) Maria Luisa Ribeiro Ferreira, Ecofeminismo - Cantata a quatro vozes, Éticas e Políticas Ambientais, Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, Lisboa 2004, p. 228

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