quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Por que razão não perdoamos?

"Crap! I want to forgive, but I can't! Why?!"
No outro dia em conversa com uma amiga, ela perguntava-me por que raio é que nós reparávamos sempre naquilo que os outros faziam mal, mesmo que essa pessoa fizesse milhares de coisas bem. Basicamente, porque é que o mal se sobrepunha ao bem, mesmo quando, em quantidade, este último ganhava. A conversa mudou de rumo mas a questão dela não me saiu da cabeça. É certo que não tinha sido a primeira vez que que me tinha interrogado sobre isto, mas também, em nenhuma das outras vezes, tinha querido ter o trabalho de pensar. Entretanto, comecei a ler Sobre o Sentido e a Referência, de Frege, que é uma espécie de um artigo acerca da filosofia da Linguagem, e dou por mim com a resposta na minha cabeça após algumas horas de leitura. Deixem-me tentar explicar.

O que penso que se passa é que nós abarcamos todas as experiências como um todo. Como se cada experiência fosse parte de uma noção pré-concebida que nós temos. Se pensarmos que primeiro vem a noção do que queremos experienciar e só depois vem a experiência em si, compreendemos facilmente a nossa sensação de surpresa quando não esperamos algo. Porque, na verdade, esperamos sempre alguma coisa. E, como é claro, queremos sempre esperar o melhor. Mesmo que "saibamos" de antemão que nada do que estamos a pensar se vai passar, resta-nos sempre esperança. Ora, o que acontece com as más acções dos outros é precisamente isso: nós esperamos que eles ajam de uma forma e eles agem de outra. Agora percebemos porque é que ficamos desiludidos com as más acções. Resta-nos responder por que razão elas se sobrepõem a uma infinitude de boas.
Isto acontece pelo facto de que quando os outros agem bem, essa acção é só uma continuação do que nós esperávamos e quase que o seu reconhecimento passa despercebido, por se encadear tão bem na nossa "fé". Como esta esperança é constante, como esta esperança é insubstituível, quando alguém a quebra, acaba por quebrar uma parte de nós que tomámos como infinita. E "quebrar o infinito" é inesquecível. É como quebrar uma jarra com quatrocentos anos. Se todos os dias a limparmos bem, ninguém vai notar que ela lá está, limpa e brilhante. Mas se alguém algum dia a quebrar, os cacos nunca voltam ao lugar de origem.
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