sábado, 26 de novembro de 2011

Descobertas impressionantes

Ontem comprei um rato para o meu computador e durante o dia de hoje, só me apetecia ter coisas para clicar, apetecia-me clicar em tudo. Para mal dos meus pecados, estou a fazer um trabalho bastante longo, que me vai demorar o fim-de-semana todo e segunda-feira, que não tenho aulas (a trabalhar bem, esperemos!) e hoje mudei a letra umas três ou quatro vezes de propósito para usar o rato novo. Fez-me pensar no ridículo que é quando nos entusiasmamos por uma coisinha de nada. Ainda por cima por uma coisa comprada. Compreendia-se se eu estivesse feliz por ter atingido um qualquer objectivo importante na minha vida e precisasse de o expressar, que se não rebentava. Mas agora um rato? Um rato de computador? Por amor de deus.

Bem, vou continuar o meu futuro extraordinário trabalho (que é sobre o Budismo, já agora), não sem antes partilhar uma música dos meus cantores preferidos. Acho que já mencionei aqui (bolas, num ano, quase de certeza que sim!) que venero o Sérgio Godinho e conheço a sua discografia toda. Ou achava que conhecia, porque hoje pus a tocar todos os seus álbuns e dei de caras - ou de ouvidos - com uma música extraordinária. Não sei como me passou ao lado, mas é bela. Faz lembrar Teresa Gentil (ponho o link abaixo de uma dela, para quem não conhece) mas em versão masculina. Adorei e até me sinto envergonhada por a ter tocado pela primeira vez tantos anos depois.


Esta acima, da T. Gentil não faz lembrar muito, mas eu gosto e por isso, aqui vai. (E também é verdade que a que eu queria não estava disponível no YouTube e eu não tive paciência de a pôr...)



Do mal o menos e em 7 meses só foi vista 190 vezes. Oiçam, acompanhem com letra, que é sempre necessária em Sérgio Godinho, e aproveitem - de certeza que vão gostar.

Um homem corre na noite
é uma imagem banal
podia ser em Madrid
ou Johanesburgo,
ou em S. Paulo
ou Budapeste, Nova Iorque
ou Hollywood
ou é claro em Portugal
um homem corre na noite
é uma imagem banal
Porque foge? De onde vem?
porque olha para trás inquietado?
Será soldado? vagabundo?
criminoso? ratoneiro?
será apenas o primeiro?
dos que vão fugir com ele?
Foge p'ra salvar a pele
só a sua? a pele dos outros?
a pele clara ou escura?
quanto tempo vai durar a sua fuga?
quanto dura? o que espera?
o que espera o homem - fera
se chegar a quem o espera?
alguém o quer?alguém se acende?
alguém o chora?
alguém por quem ele chorou
chorará por ele agora?
alguém que nunca o trairá
e se sim, onde será?
Um homem luta contra o sangue
que derrama
e diz: faleu a pena?

Que os barcos
voltem a subir o Guadiana
vindos de longe
do mar (2x)

Que os barcos
voltem a subir o Guadiana
descarregando à passagem
do o trigo
que o cavalo esbaforido
chegue à relva, sua cama
que o fugitivo
encontre o seu porto de abrigo

Um homem corre na noite
é uma imagem banal
esgueirado de holofotes
com a estrada que atravessa
se confunde
com o seu breu do seu corpo
se confunde
e se passa um muro branco
fica branco como o cal
tal e qual
o camaleão
é uma imagem banal

Um homem luta contra o sangue
que derrama
em que cama
terá ele o seu repouso?

está ancioso? e como não?
não estaria quem pisasse
um desconhecido chão?
Não estaria de garganta afogueda
quem por nada
assim fugisse?
quem por tudo suplicasse
dá-me forces, dá-te forces
a ti próprio te confias
dá-te alento. dá-te tempo
dá-te dias
sobrevive de agonies
respirando sobrevives
sobrevive
Um homem vive
contra o sangue
que derrama
e diz: valeu a pena?


Que os barcos
voltem a subir o Guadiana 

vindos do longe do mar

(...) descarregando à passagem
do o trigo
que o cavalo esbaforido
chegue à relva, sua cama
que o fugitivo
encontre o seu porto de abrigo.

Um homem corre na noite
é uma imagem banal
porque insiste? porque teima?
não há pânico na rua
não há fogo no quintal
labaredas? só na cama
dos amantes
já distantes
chegam ruídos, utopias
quanto vale uma utopia?
vale tudo? quanto vale?
um homem corre na noite
é uma imagem banal
o que fez o fugitivo? Por que morre?
se está vivo é porque morre.
se morrer é porque o matam
se o matarem sera justo?
inocentes são os culpados de outros crimes
de que culpa?
de paixão? de inconsciência?
será justo ou não sera
desbaratar a inocência
tão a custo conquista?
porque corre o fugitivo nessa estrada?

E agora para 

para agora
o homem para
para agora para agora
será que sente que chegou a sua hora?

Não é possível
correr tanto
e pensar tão
lucidamente
o coração
não aguenta
a cabeça também não
porque tenta
ultrapassar os seus limites?

provavelmente
é por vontade de viver
que ultrapassa os seus limites

'estamos quites'
diz para o seu coração

sentes que valeu a pena?
se te obrigam a fugir
mais te obrigam
a chegar junto a ti

valeu a pena?

(Desculpem possíveis erros, embora a letra tenha sido revista por mim porque a que havia estava errada.)

Próximo post: Mimesis e Catarsis