sábado, 17 de dezembro de 2011

Filosofia da época colonial

Hoje venho falar-vos de uma área que para mim era totalmente desconhecida. É incrível nós acharmos que até sabemos um bocadinho de tudo, pelo menos assim por alto, mas depois, quando nos deparamos com coisas realmente novas, conseguimos espantar-nos por aquilo que as pessoas nos dizem não nos soar sequer ao ouvido.

Entre 1807 e 1898, as colónias espanholas, como a Argentina, começam a querer emancipar-se. A América torna-se independente de Espanha, e começa a querer romper todos os laços culturais, políticos e sociais, até mesmo querer mudar a língua, para se distanciar o mais possível do país que a colonizou. É o que se pode chamar 'espanofobia'. Os indígenas eram completamente mal tratados e escravos dos espanhóis e a revolta começou. Com este processo em desenvolvimento, torna-se muito confuso se realmente se deve (re)constituir uma identidade hispano-americana ou se, pelo contrário, se deve criar uma identidade nova, estritamente americana e sem raízes nenhumas em Espanha. É preciso ver que para a América, Espanha é o antigo periclitado, enquanto que, de uma perspectiva espanhola, o país tenta a todo o custo recuperar as colónias que havia perdido. 
Pensadores da época de 98 (Unamuno é um exemplo), inclusive, dizem que não se pode reconquistar a América. É um feito impossível e sem qualquer fundamento nem benefício para os Espanhóis, já que eles estavam completamente manchados no continente Europeu. Assim, acabariam por beneficiar mais se tentassem um vínculo espiritual, já que tinham passados três séculos de colónias e por isso era necessário que aceitassem uma identidade hispano-americana em vez de quererem impôr a cultura e tudo o que daí advém à força.

É para mim engraçado ver esta imagem,
já que não estou habituada a ver
esta parte do mapa colorida :)


Os espanhóis do século XVIII começam então a trocar ideias sobre o que será melhor para Espanha. Neste ponto, surgem três problemas fundamentais. Qual é a legitimidade do domínio político espanhol, a licitude ou ilicitude da guerra contra os índios e, mais aprofundadamente, a natureza do índio e sob que regime deveriam os indígenas viver. Para fazer um apanhado geral, os três pensadores principais são Frei Antonio de Montesinos, que foi o primeiro a 'gritar' em nome da liberdade humana no 'novo mundo', ou seja, tomava parte pelos indígenas e pelos seus direitos, Frei Francisco de Vitória e Frei Bartolomé de Las Casas.

Quanto a Francisco de Vitória, não publicou nada em vida, dado que foi ameaçado pelo rei de então, Carlos V, de que seria morto se publicasse ou se difundisse as suas ideias. Assim, começa a escrever às escondidas cartas de apoio aos indígenas, apoiando também o total desmame das colónias por parte de Espanha. Sempre se opôs, está claro, a qualquer tipo de violência e o mais interessante no caso deste autor é que o seu projecto/objecto de estudo era sobre os limites humanos e os limites de poder, combinando direito natural, positivo e divino. Para ele, a filosofia não pode ser pensada sem ser pensada em conjunto com o direito, a teologia e a moral, partindo do princípio que, se os índios são humanos, então também estão aptos para receber a fé católica. A partir daqui, podemos perceber que o que apregoa não é realmente o que escreve, já que se fosse totalmente apologista de um desmame como foi dito acima e como o próprio não se cansa de referir, não tentaria sugerir que a fé cristã devesse ser abarcada pelos indígenas. Mas aqui o salto realmente importante é que eles sejam considerados pessoas e mais, que sejam capazes de apreender o mesmo que os espanhóis apreendem - a fé. Com todas estas novas ideias, funda o direito internacional, nunca esquecendo de referir que não se podem negar direitos a ninguém (ou seja, não se podem negar direitos aos infiéis) só pelo simples facto de não serem cristãos. Nega também a supremacia do Papa, tendo em conta que este doava terras indígenas a espanhóis e os soldados da metrópole só serviam para expulsar os indígenas das suas terras. Ou seja, o Papa não pode doar aos Reis o Novo Mundo.

Francisco de Vitória



Bartolomé de Las Casas tem uma história bastante interessante. O seu pai, membro da nobreza, ofereceu-lhe um escravo índio para que o acompanhasse nas suas brincadeiras de miúdo e para que o servisse. O que o senhor n\ao podia adivinhar era que o filho ia gostar tanto do escravo que havia de criar uma teoria e direitos indígenas alguns anos depois. Passou pela América e em 1512 foi para Cuba e conquistou-a. Como recompensa das suas acções, recebeu várias partes de terra oferecidas pelos indígenas. No entanto, como bom homem que era, renunciou às terras publicamente, voltando a Espanha para defender os índios. Propõe uma penetração pacífica, a liberação de todos es escravos em Espanha e uma evangelização progressiva e também pacífica. Reclama ainda que se deve entregar aos indígenas o que lhes foi injustamente retirado. Defende tudo isto perante o rei Carlos V em 1520. Teoricamente, estava abolida a pena de morte e então, acaba por pressionar Filipe II para que ela seja na prática abolida, na Comissão de Valladolid. Sugere novas leis, mais uma vez, que são uma repetição daquelas que sugeriu a Carlos V, mas mais específicas, como por exemplo a supressão da guerra da conquista. É assim considerado o primeiro 'indigenista' das Américas.
Em termos de obras, podemos referir que as suas ideias sobre o pacifismo estão naquela que é conhecida como Del único modo de atraer a todos los pueblos a la verdadera religión e a Apologética historia sumaria, onde tenta aplicar o método comparativo ao estudo cultural dos indígenas. 

Bartolomé de Las Casas


Contra estes três, temos Ginés de Sepúlveda, que era um humanista, teólogo e preceptor do filho de Carlos V, Filipe II. Sofre uma grande influência de Aristóteles, acabando por reafirmar a necessidade de guerra perante a recusa da escravidão, já que esta era uma coisa natural.

Ginés de Sepúlveda


E assim se pode caracterizar, de uma forma muito breve, sem sequer mencionar a importantíssima força do Krausismo e do Positivismo, aliados à presença de José Martí. No entanto, para os mais curiosos, deixo links aqui, aqui (muito bom), aqui e aqui sobre o tema em questão.


Quero aproveitar para vos recomendar um projecto que começou agora, de três colegas de turma. Promete.http://en800palabras.blogspot.com/
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